“Há um tempo em que
é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo e
esquecer os velhos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo
da travessia. Se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de
nós mesmos.”
“Regredir para
Progredir” é uma frase frequente com quase todos os pacientes, que no início da
terapia se queixam de estar a piorar…. Quando investigamos o significado deste
“estar a piorar” rapidamente percebemos que falam sobre estar mais em contacto
com os seus sentimentos, histórias, tristezas, caminhos…. Falam sobre a possibilidade de começar a
navegar no seu corpo, trazendo à consciência novos dados, factos e sentimentos
que estavam soterrados por diferentes mecanismos de defesa, que abafam a dor
mas também a alegria e o prazer de viver.
Mergulhar neste
processo de desenvolvimento pessoal e autoconhecimento, passa muitas vezes por
inicialmente nos sentirmos mais fracos, mais vulneráveis, mais tristes, mais
isolados, mas também mais conscientes, mais enraizados, mais perto da nossa
verdade interna.
Ainda ontem em
consulta com uma adolescente ela falava sobre como este verão tinha sido
difícil, porque continua a sentir-se muito em baixo. Paralelamente falava
também com enorme clareza sobre todas as suas vivências e reflexos de tudo isso
na sua vida atual. Nos primeiros meses de terapia não era capaz de ter esta
clareza, pelo contrário, tinha vivido inúmeras situações em que se sentiu
magoada, rejeitada e sozinha sem sequer perceber o que estava a sentir, ou
melhor, sem sentir!
Felizmente, ou
infelizmente, tudo o que reprimimos ao longo da vida, não deixa de existir!
Colocar para “trás das costas”, inibindo a consciência das nossas emoções, nem
sempre é a melhor solução. Este mecanismo de Repressão, deslocando pensamentos,
ideias, emoções, ou desejos perturbadores da consciência para o inconsciente,
não faz com que tudo isso não continue a condicionar a nossa vida e os nossos
comportamentos. Precisamos fazer pontes com o passado, para trazer à superfície
tudo o que navega nesse mar infindável que é o nosso inconsciente.
Este processo de
enraizamento e consciência traz dor, talvez seja verdade, mas é absolutamente
necessário na caminhada em direção a nós próprios, ao centro do nosso Ser.
A maioria das
pessoas não foge conscientemente aos seus sentimentos… Apenas não aprendeu a
poder entrar dentro de si e olhar para as suas emoções, tal como não aprendeu a
escutar a voz do corpo, que tantas vezes nos fala. É como se vivessem a planar,
com medo do que o contacto com as emoções possa trazer, com medo da expressão,
com medo de poder ser apanhado de surpresa e ficar submergido por uma qualquer
emoção, com medo de se expor ou com vergonha de sentir. Quando a pessoa se
encontra assim, desenraizada e pouco presente, o Ego tem tendência a reagir de
forma menos racional e consciente e são tantas as vezes que acabamos por não
conseguir compreender porque nos comportamos de determinada maneira ou porque
sentimos raiva, medo, insegurança, perante factos que quando pensamos sobre
eles, até não são muito importantes…
Assim vamos vivendo ao lado do nosso processo de desenvolvimento
pessoal, sem capacidade de abraçar a verdade, da nossa verdade interna e
ficamos aquém de nós próprios! Ficamos enredados num processo de contração
física e emocional que nos impede de viver plenamente o nosso quotidiano.
É fundamental
abrirmos campo à nossa capacidade de nos tornarmos mais conscientes, mais
presentes, mais enraizados, mais conscientizados… Basta decidirmos começar a
desenvolver em nós a capacidade de vivermos mais “awareness”, focalizando a
nossa atenção em todos os pequenos detalhes do nosso quotidiano e aprendendo a
respirar. Focalizar a consciência em tudo o que estamos a fazer, desde tomar
banho, comer ou conduzir, acompanhando sempre com uma respiração consciente
pode trazer descobertas incríveis sobre nós próprios…
É maravilhoso o
quanto podemos descobrir a respeito da nossa existência, simplesmente prestando
atenção e tronando-nos mais profundamente conscientes do nosso experienciar….
Não estou a falar de
meditação, porque sei o quanto pode ser difícil incluir esse ritual no
dia-a-dia agitado deste nosso século XXI, mas ainda assim, acredito que podemos
integrar pequenas ferramentas que nos ajudem nesta caminhada de volta a nós
próprios. É profundamente apaziguador compreender o que fomos, o que somos e
porque somos; Compreender os nossos padrões, mecanismos de defesa e pacificar
isso dentro de nós.
Vários sábios já
disseram que o mundo está aqui ao nosso lado, tudo o que temos que fazer é
esvaziar as nossas mentes e abrir em nós a possibilidade de recebê-lo!
Começar por aprender
a Sentir é sem dúvida o primeiro grande passo para nos podermos Fortalecer…
Ana Galhardo Simões, Psicoterapeuta
Corporal na MD|Clinic
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